Carta a um Irmão Ainda Preso na Missão da Seita Nova Acrópole
Eu poderia começar com acusações. Poderia listar os absurdos, os abusos, os silêncios. Mas isso você já conhece — e escolheu não ver.

Então vou falar de outra forma.
Quero perguntar a você, que ainda veste azul, laranja ou preto com devoção. A você que acredita, de verdade, que está construindo um mundo melhor. Que se vê como parte de algo maior, algo puro, quase sagrado.
Mas me diz:
Você consegue realmente estar em paz sabendo que o fundador a quem você tanto reverencia mentiu deliberadamente sobre sua história?
Sobre seus títulos, sobre o tal vínculo com Sri Ram, sobre a origem da Nova Acrópole que, na verdade, era apenas seu trabalho na Sociedade Teosófica — da qual foi expulso?
Você sabia que as datas foram manipuladas para parecer que Nova Acrópole já existia antes dessa expulsão? Que a fundação mística, limpa e elevada é, na verdade, um desvio conveniente da cronologia real?
Consegue repousar a cabeça no travesseiro sabendo que, enquanto você dedica sua juventude e seu vigor, vivendo apertos, renúncias e cansaço — seu diretor internacional e os diretores nacionais recebem gordos salários para viver com conforto e status, enquanto você paga mensalidades cada vez mais altas para sustentar essa estrutura?
Você acha justo sacrificar finais de semana, viagens intermináveis, treinos físicos, humilhações “pedagógicas”… enquanto eles descansam, são servidos, e vivem uma vida que você só verá em sonho — tudo isso em nome da “missão”?
Você ainda sente fogo no que aprende? Ou só o peso da responsabilidade? Quando foi a última vez que algo ali realmente tocou sua alma?
E esse vínculo com a “Grande Fraternidade Branca”… onde está?
Onde está a justiça cósmica diante dos abusos, das mentiras, das pessoas adoecendo no topo e na base?
Você, que é o elo mais forte e mais puro dessa corrente, está assistindo seus líderes adoecerem física e moralmente — e continua a acreditar que isso é espiritual?
E quanto ao patrimônio particular dos diretores? Já pensou quem herdará tudo isso?
Enquanto os herdeiros dos diretores nacionais ficarão com enorme patrimônio… Seja o patrimônio obtido pela “Guru” de Oinab-Norte, que agora enriquece suas filhas, ou no caso de Oinab-Sul, onde os filhos e neta da Luzia enriqueceram com o furto do dinheiro suado dos próprios acropolitanos, a partir da história do Talal Husseini — ou “Guru Akbar”, que se reinventa agora — você sabia que ele enganou centenas de irmãos, sumiu com milhões, e foi protegido até o fim?
Que os mesmos “mestres” que você ainda respeita sabiam de tudo, acobertaram, e ninguém jamais foi responsabilizado?
Se isso não abala sua fé… talvez já não seja fé.
Se isso não gera indignação… talvez você tenha se esquecido do que é justo.
Você talvez diga que nada disso importa. Que o que você vive é verdadeiro. Que o que proporciona aos seus discípulos e companheiros é válido e profundo.
Mas já parou para refletir sobre a tolice e a irresponsabilidade dessa ideia?
Você não é eterno.
E se fizer um bom trabalho, formará pessoas puras, confiantes, idealistas — que vão confiar em você. E então você vai entregá-las, com sua bênção, nas mãos de lobos vestidos em pele de cordeiro.
Você vai ser aquele que preparou corações sinceros para serem despedaçados depois — tudo porque não teve coragem de ver o sistema até o fim.
Você diz que vive uma família espiritual…
Grande família.
Quantos irmãos que “quebraram” pelo caminho você realmente procurou com o coração aberto?
Quantos deles você buscou depois, sem arrogância, sem a soberba de pensar: “eu fui firme, eles é que eram fracos”?
Quantas histórias você sequer quis ouvir até o fim?
Você tem certeza de que a Instituição foi justa com eles? Ou só repetiu o discurso pronto para evitar o incômodo de pensar com autonomia?
E agora me diga com sinceridade:
Com quantos desses irmãos você ainda poderá contar no dia em que sair da instituição?
Quantos estarão lá fora, te esperando com afeto verdadeiro?
Quem já saiu sabe: não poderá contar com ninguém de dentro.
E, se tiver sorte, encontrará algum ex-acropolitano que, mesmo ferido, estenderá a mão.
Porque só quem saiu entende o estrago que Nova Acrópole faz por dentro — e a importância de ser acolhido por quem já viu a verdade.
Quem da sua família você deixou para trás, chamando de “apego”?
Sua mãe, quando pediu para você ficar mais tempo e você respondeu que tinha “atividade filosófica”? Seu filho ou filha, que você deixou de participar dos momentos mais importantes, porque estava “em missão”? Ou foi você mesmo — aquele que ria alto, que fazia perguntas demais, que sonhava com outra vida?
Quantas vezes você se calou diante de algo que te pareceu errado — mas abafou a dúvida dizendo que “a Hierarquia sabe o que faz, então o kharma não é meu”?
Quantas vezes viu alguém ser humilhado e disse que era “prova iniciática”?
Quantas vezes justificou o injustificável em nome de um ideal que nunca teve rosto?
Você diz que está se lapidando. Que está renunciando a si mesmo para ser um instrumento do Bem. Mas te pergunto: em que momento servir ao Bem passou a significar sufocar o que é humano? Seu cansaço, sua dúvida, sua tristeza — você chama tudo isso de “kurava”. E assim, abandona a si mesmo todos os dias.
Você ainda se reconhece no espelho?
Ou está apenas representando um papel: o do forte, do justo, do servidor incansável… enquanto por dentro tudo pede socorro?
E me diga com sinceridade: quantos ao seu redor estão adoecendo, mas você prefere não ver? Porque admitir isso seria encarar que talvez… talvez… vocês não estejam salvando o mundo. Estejam apenas sustentando uma ilusão bem montada.
Você tem medo de sair. Eu sei.
Medo de ser chamado de traidor. Medo de ser esquecido. Medo de que tudo tenha sido em vão.
Mas vou te dizer algo que ninguém aí dentro vai te dizer:
Você não precisa continuar sacrificando sua alma para provar que é bom.
Você não precisa ser leal a quem exige sua morte emocional em nome da “missão”.
Você pode escolher a verdade — e ainda assim ser digno. Talvez, pela primeira vez.
Quando essa estrutura ruir — e ela vai ruir, cedo ou tarde — o que restará de você?
Espero que reste coragem.
Espero que reste compaixão por si mesmo.
Espero que reste tempo para reconstruir os vínculos que foram rompidos em nome de algo que nunca foi real.
Essa carta não é uma acusação.
É um apelo.
Antes que seja tarde demais.
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